Ricardo Carneiro | Diplomatique Brasil

O debate sobre teoria e política econômica que na atualidade tem mobilizado economistas e políticos progressistas, sobretudo nos Estados Unidos, recentemente reintroduzido no Brasil, no âmbito do mainstream, por André Lara Rezende (https://www.valor.com.br/cultura/6149939/andre-lara-resende-escreve-sobre-crise-da-macroeconomia), a despeito de relevante, padece de alguma dose de irrealismo. E isto não por conta do tema geral que propõe, bastante oportuno; a reabilitação da política fiscal; mas por desconsiderar o contexto político e econômico no qual se insere e, por isso mesmo, não tomar em conta questões mais gerais e opções de política econômica que extrapolam o dilema política fiscal versus política monetária. A abstração da correlação de forças no atual momento histórico e, sobretudo, a desconsideração da forma de operação de um capitalismo crescentemente financeirizado reduzem a viabilidade de suas propostas.

A discussão versa sobre o papel do gasto público na economia e como financiá-lo, estando embasada em dois suportes analíticos; a teoria das finanças funcionais e a moderna teoria monetária (MMT, na sigla em inglês). As origens de ambas são, de um lado, o cartalismo enquanto concepção da moeda e, de outro, o keynesianismo, mas foram pioneiramente articuladas pelo economista Aba Lerner nos anos 1940 nos Estados Unidos, e posteriormente, refinadas por um grupo de economistas pós-keynesianos que tem em Randall Wray sua figura central, com ramificações em outros professores universitários e assessores do senador Bernie Sanders. A teoria postula que diante da tendência inerente das economias de mercado ao subemprego, por conta da instabilidade e oscilações cíclicas do gasto privado, o gasto público tem um papel estrutural e permanente na estabilização da economia e obtenção do pleno emprego. A apregoada e fictícia restrição, proposta pela ortodoxia, relativa à escassez dos recursos necessários para realizar tais gastos, não seria relevante porque o Estado, por emitir a moeda do sistema econômico, não estaria sujeito a restrições de financiamento. Em outros termos, para um governo soberano emissor da moeda fiduciária as questões da solvência, da sustentabilidade fiscal ou mesmo das taxas de juros elevadas, não se colocam.

Para examinar as proposições em detalhe, convém separá-las em duas partes, às quais correspondem não só arcabouços de política econômica como fundamentos teóricos distintos. Primeiro, há a questão do gasto, ou mais propriamente do déficit público e sua capacidade efetiva de assegurar o pleno emprego da economia. Há aqui um conjunto de questões gerais, que subordinam os temas macroeconômicos, dentre as quais, as relações mais permanentes, incluindo a sinergia e complementariedade, entre o gasto público e o privado. Seguem-se todos os aspectos macroeconômicos relativos ao tamanho e efetividade do gasto e mais precisamente, ao seu efeito multiplicador da renda. No plano do financiamento, antes de considerações financeiras é necessário por em relevo o contexto no qual esse financiamento público se realiza ou, mais precisamente, o grau de liberalização e liquidez dos mercados financeiros, que em última instância lhes confere os graus de liberdade, para além das propriedades genéricas da moeda e dos privilégios do Estado.

Leia o artigo completo aqui.