Pesquisas premiadas analisam os efeitos da financeirização sobre o trabalho e revisitam os limites da política macroeconômica em países em desenvolvimento.
PREMIAÇÃO
Duas pesquisas desenvolvidas no Instituto de Economia (IE) da Unicamp conquistaram o primeiro lugar nas categorias Mestrado e Doutorado da 39ª edição do Prêmio BNDES de Economia, uma das principais premiações acadêmicas do país na área. O resultado foi anunciado pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) e a entrega dos prêmios ocorreu no dia 17 de dezembro, durante o 53º Encontro Nacional de Economia (Anpec 2025), realizado no Insper, em São Paulo.
Na categoria Mestrado, o primeiro lugar foi concedido à dissertação "O trabalho no tempo da financeirização", de Lucas Prata Feres, defendida no IE Unicamp, sob orientação dos professores Hugo Miguel Oliveira Rodrigues Dias e Alex Wilhans Antonio Palludeto. Já na categoria Doutorado, a vencedora foi a tese "Macroeconomia aberta no curto prazo e restrições externas: para além do trilema de política monetária", de Nathalie Tellez Marins, também desenvolvida no Instituto, orientada pelas docentes Daniela Magalhães Prates e Rosângela Ballini.
A dissertação de Lucas Feres investiga os impactos da financeirização da economia sobre o mercado de trabalho, com foco no avanço de vínculos precários, na informalização e na dissociação crescente entre tempo de vida e tempo de trabalho. A pesquisa analisa como a centralidade do capital financeiro, da lógica acionária e da valorização via mercado financeiro tem reconfigurado profundamente as relações laborais no Brasil e em outros países.
Com base em dados do mercado de trabalho brasileiro, o estudo mostra que, entre 2012 e 2021, o número de trabalhadores em regime de tempo parcial cresceu 39,2%, enquanto o contingente de pessoas com jornadas inferiores a 30 horas semanais aumentou 41%. No mesmo período, o número de trabalhadores por conta própria passou de 21,4 milhões para 25,5 milhões. A informalidade também se intensificou: entre 2015 e 2021, a proporção de ocupações sem carteira assinada no setor privado subiu de 23% para 28%.
A pesquisa aponta ainda mudanças qualitativas nos vínculos de trabalho, como a expansão de contratos com CNPJ próprio no setor de serviços — frequentemente utilizados como substitutos de relações formais, mas sem garantias trabalhistas — e o crescimento expressivo dos contratos intermitentes, que aumentaram 245% entre 2015 e 2019. Segundo o autor, esses formatos consolidam relações marcadas por instabilidade, imprevisibilidade de renda e desproteção social.
Feres interpreta esse processo como uma nova forma de controle do trabalho, caracterizada pela “subsunção do trabalhador à lógica financeira”, na qual o tempo de trabalho passa a ser regulado por metas financeiras, plataformas digitais e algoritmos, em vez de normas coletivas ou produtivas. “O capital não organiza mais o trabalho diretamente em todos os casos, mas continua extraindo valor por meio de mecanismos como produtividade por entrega e avaliação algorítmica”, afirma.
Ao comentar o prêmio, Lucas Feres destacou a relevância do reconhecimento institucional em um momento de crise social e econômica. Atualmente, ele atua na área de impacto social da Fundação Estudar.
Na categoria Doutorado, a tese de Nathalie Marins propõe uma releitura crítica do debate sobre política monetária em economias abertas, questionando o chamado “trilema da política monetária”, segundo o qual países não podem combinar simultaneamente câmbio fixo, livre mobilidade de capitais e autonomia da política monetária. A autora argumenta que existe, sim, margem de manobra para a política monetária, mas que ela é condicionada pelas restrições externas, especialmente pela situação do balanço de pagamentos e pelos efeitos das decisões de juros sobre o câmbio e a percepção de risco.
A pesquisa incorpora contribuições da macroeconomia estruturalista e pós-keynesiana, recuperando autores clássicos do debate dos anos 1950 e dialogando com discussões contemporâneas sobre fluxos de capitais e integração financeira. Para Nathalie, o desafio central não está em escolher uma combinação ideal de políticas, mas em compreender como as restrições externas moldam, de forma concreta, o espaço efetivo de atuação da política macroeconômica nos países em desenvolvimento.
Segundo a autora, a tese nasceu do interesse em compreender, em termos teóricos, os limites e possibilidades da política macroeconômica em economias financeiramente integradas. Ao receber o prêmio, Nathalie destacou o papel histórico do BNDES no estímulo à pesquisa econômica e ao desenvolvimento do país.
A 39ª edição do Prêmio BNDES de Economia contou com 94 trabalhos inscritos, sendo 63 dissertações de mestrado e 31 teses de doutorado, provenientes de 21 centros de pós-graduação de todo o Brasil. A avaliação foi conduzida por uma comissão examinadora composta por nove integrantes, incluindo cinco representantes do BNDES e quatro professoras externas, todas com titulação de doutorado.
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O Instituto de Economia da UNICAMP foi criado em 1984 e tem por finalidade a promoção do ensino e da pesquisa na área de Economia.
